quinta-feira, 22 de março de 2018

Educação para a morte – uma educação sobre e para a vida.







Potencialmente, a consciência de que o tempo que dispomos é limitado faz com que mobilizemos com maior frequência a expressão de amor na interação com o meio que nos rodeia. De uma forma global, as investigações indicam que a proximidade com a morte, como por exemplo no caso de pessoas com doença terminal e presos condenados a pena de morte, promove frequentemente a expressão de conteúdos associados a temas como o perdão, o arrependimento, reconciliação, gratidão, declarações de inocência, o afeto e também, não poucas vezes, o reforço de mensagens de ativismo social e/ou político.

A consciência da finitude é a principal fonte de angústia para o ser humano. O instinto de preservação e sobrevivência faz com que todo o ser vivo tente manter a sua vida com todas as suas forças. O medo pode funcionar como um mecanismo bastante útil para a preservação das espécies. Este instinto de preservação, em conjunto com uma espécie de anseio do Homem em ser eterno, chega a negar a morte, conferindo a esta uma conotação de tabu que faz com que sejam algumas vezes acionados esforços no sentido de escondê—la, silenciá—la, ocultar toda a dor e sofrimento causado. É a partir da década de 50/60 do século passado que a temática da morte começa a ser maior alvo de atenção por parte da sociologia, etnologia, antropologia e da psicologia, promovendo uma maior consideração sobre a importância de um movimento de  educação para a morte (desenvolvimento pessoal que se baseie numa preparação para a morte).

O medo da morte traz como consequência estados de ansiedade que interagem como forças de atrito relativamente ao entendimento do final da vida como um processo natural inevitável. Pode dar-se em forma de medo à dor, medo de sofrer, medo da dependência, da separação e perda com e de tudo e todos que amamos, perda de controlo, medo do desconhecido. Talvez o pior de todos os medos seja o medo ao próprio medo que se torna mais intenso quanto mais dele tentamos escapar. Temos sobretudo medo da vida e, por isso, medo da morte. Temos muito medo de não sermos capazes de atingir uma plenitude existencial que se poderá eventualmente traduzir na concretização abundante do Amor. 

A vida é uma contínua dança entre nascimento e morte, uma dança de transformação, de impermanência. Desperta-se para a vida através da consciência e aceitação da morte. Aprendendo a viver, aprende-se a morrer. Quando acreditamos que as coisas são permanentes, resistimos a aprender a mudança. Aprender a viver é aprender a fluir com a (nossa) natureza. 

Conceber a morte como um processo universal da natureza, o que realmente é, pode ajudar a diminuir o medo e facilita a sua integração. Quando aceitamos e estamos conscientes da morte, transformamos a nossa atitude perante a vida, somos mais realistas, experienciamos maior sintonia e compaixão connosco próprios, com os outros e com o mundo, vivendo com maior qualidade.

Apesar de tudo, e como nos diz o famoso psicoterapeuta Irvin Yalom, ”não é fácil viver cada momento absolutamente consciente da inevitabilidade da nossa morte. É como tentar olhar para o sol e manter os olhos fixos: qualquer um de nós só consegue fazê-lo durante alguns segundos”. É pois muitíssimo natural que criemos estratégias para suavizar o terror da morte. De certa forma, nunca a poderemos eliminar por completo.  Pensar e falar na morte dói e dói também porque este é o preço a pagar por amarmos. 

Dr. André Viegas
Psicólogo Clínico
O Canto da Psicologia



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